domingo, 6 de fevereiro de 2011

Um Espião de Stalin no Japão


 A história está repleta de casos onde apenas um homem foi capaz de mudar os destinos de toda a humanidade. Alguns deles serão eternamente lembrados. Outros, estão relegados a um papel secundário e – não raro – são completamente esquecidos. O espião russo Richard Sorge é apontado como o maior responsável por um acontecimento que mudaria definitivamente o resultado da Segunda Guerra Mundial. Apesar disso, foi quase completamente e apagado da história pela ditadura stalinista.

Foi Sorge que transmitiu a Stalin a informação de que o Japão não atacaria a União Soviética, permitindo o deslocamento das tropas do Exército Vermelho estacionadas na Sibéria para conter o avanço de Hitler no front europeu. Sorge acabou preso pela polícia secreta japonesa e enforcado por espionagem em novembro de 1941. Mas o seu trabalho seria determinante para alterar o cenário global da guerra colocando o jogo a favor dos exércitos aliados.

A premiada artista alemã, Isabel Kreitz, lançou em 2008 um romance gráfico que resgata para a opinião pública mundial a figura de Richard Sorge, considerado como um dos mais importantes espiões da história. Para se ter uma idéia da importância de Sorge, basta dizer que o escritor Ian Fleming, criador do personagem 007, aponta o russo como um dos mais formidáveis espiões de todos os tempos.

O  livro de Isabel Kreitz relembra os últimos meses de vida de Sorge no Japão, a partir dos testemunhos de homens e mulheres que conviveram com ele em Tóquio enquanto o espião repassava informações secretas sobre os movimentos das tropas alemãs e japonesas para Moscou. Para concretizar seu projeto, Isabel realizou amplas pesquisas sobre o cenário de Tóquio nos anos 30. Além disso, ela levantou documentos da época e resgatou entrevistas antigas concedidas por personagens já falecidos.

Apesar de uma longa e sólida militância junto ao partido comunista alemão e de passagens pela Rússia para estudos marxistas, Sorge conseguiu conquistar a confiança de funcionários do alto escalão do governo japonês e do próprio embaixador alemão em Tóquio. Para isso, foi valioso um ferimento de guerra e uma medalha Cruz de Ferro, “adquiridos” durante sua passagem – ainda na juventude – pelo exército alemão na Primeira Guerra.

Stalin ignora os avisos – Apesar do risco constante de morte, o trabalho de Sorge não teve sempre, por parte do ditador russo, a devida atenção. Em 1941 ele transmitiu dados precisos sobre os planos de Hitler de invadir a Rússia (ação que ficou conhecida como Operação Barbarossa). Na época, a Alemanha tinha um tratado de não agressão com o governo russo e Stalin não acreditava que Hitler abriria uma nova frente de batalha em uma guerra que já colocava os exércitos alemães em confronto com países na Europa e África. Se as informações do espião tivessem sido consideradas, a Rússia poderia ter evitado a invasão alemã e mudado os rumos da guerra..

Documentos russos da época revelam que as atitudes extravagantes e exageradas de Richard Sorge geraram desconfiança sobre a confiabilidade das suas informações. Paradoxalmente, o mesmo comportamento que lhe servia de disfarce também o colocou em descrédito. Sorge era conhecido por bebedeiras eméritas, pela boemia e pela fama de mulherengo...

Depois de que Sorge foi preso pela polícia secreta japonesa, o Governo de Stalin teve oportunidades de resgatar o seu espião por meio de trocas de prisioneiros. Mas os russos nunca fizeram nenhum movimento efetivo para libertá-lo. Acredita-se que Stalin tenha querido esconder a existência de Sorge para fugir ao vexame de ter tido a oportunidade de barrar a invasão alemã quando teve oportunidade e não ter feito nenhum movimento em contrário. Durante décadas o governo russo sequer reconhecia a morte do espião e difundiu histórias de que Sorge teria fugido para a União Soviética após a Guerra. 

Uma boa história. Um livro... – O romance gráfico de Isabel Kreitz tem um grande mérito e alguns pontos negativos. O indiscutível ponto a favor é o fato de trazer a público a história de Sorge. Entretanto, há vários problemas no livro... O primeiro é o traço de Isabel. A artista alcança um bom resultado na reconstituição arquitetônica de ruas e prédios, mas é sofrível ao representar figuras humanas. Em certas passagens, chega a ser bastante difícil identificar os personagens... O segundo revés é o próprio roteiro. Isabel faz uma história previsível, burocrática, muito aquém das possibilidades que a trama poderia proporcionar... Por último, a concepção gráfica da narrativa também frustra. Diferente de outras histórias já comentadas aqui no Nona Arte (inclusive sobre a II Guerra), o livro também é muito convencional neste aspecto. Isabel usa o enquadramento comum e também divide o espaço da página de forma habitual.

É uma pena que a história de Sorge não tenha um romance gráfico à altura. Mas, de todo modo, fica a dica. Quem tiver a possibilidade de ter um exemplar do livro à mão pode tirar suas próprias conclusões... Por enquanto, já que o livro ainda não está disponível no Brasil, vale a pena conferir um trecho de um filme produzido no Japão sobre a história do espião que ajudou a derrotar Hitler.


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