sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Observadores privilegiados

“Em Nova York, há um passeador de cães profissional nas imediações das East Seventies Streets, um psicólogo de gatos no número 141 da Lexington Avenue e uma senhora baixinha que divide seu apartamento na Forty-Sixth Street com dois pombos que têm pernas de pau. Em Sutton Place, um homem pesca enguias de sua janela no décimo oitavo andar, e no número 880 da Fifth Avenue há uma mulher contratada pela Sociedade Norte-americana de Pesquisa Psíquica para investigar fantasmas e outros fenômenos paranormais. Em várias partes da cidade existem clubes de gente que não bate bem da bola e de gente que está pela bola sete, e todo ano as prostitutas enchem a bola dos proxenetas e promovem um Baile dos Cafetões num hotel do centro da cidade. Acontecem coisas em Nova York que provavelmente não acontecem em nenhum outro lugar” (Gay Talese, “Fama e Anonimato”)

Nova York é, sem dúvida, uma das cidades mais reverenciadas do mundo. Intérpretes das mais diferentes formas de expressão já dedicaram seu talento a retratar e homenagear a cidade e seus personagens. Cineastas como Woody Allen, músicos como George Gershwin, pintores como Roy Lichtenstein conseguiram transpor para a arte a paixão contagiante que a cidade imprime.

Poucos intérpretes, entretanto, foram tão felizes ao traduzir Nova York como o escritor e jornalista Gay Talese e o quadrinista Will Eisner. A referência aos dois não é um mero acaso. Um aspecto em especial une os dois artistas: ambos souberam traduzir o sentimento da massa de anônimos que vivem na cidade. As crônicas de Talese (um dos criadores do jornalismo literário) e as histórias de Will Eisner (considerado o pai da Nona Arte) falam das pessoas invisíveis, dos esquecidos, dos moradores de rua, dos moradores dos guetos da cidade...

Para quem quer conhecer Nova York nas suas entranhas, com suas contradições, absurdos e mistérios, o Blog NonaArte oferece duas dicas imperdíveis de leitura: “Nova York – a vida na grande cidade” de Eisner e “Fama e Anonimato”, de Talese. Ambos os livros lançados pela Companhia das Letras.

O olho que vê

Will Eisner dizia: “Para mim, os tipos urbanos sempre pareceram singulares em seu estilo e sensibilidades. É claro, a vida nas entranhas de uma grande cidade é muito diferente daquela de uma pequena comunidade rural. Conforme acumulam-se a astúcia das ruas e as habilidades de sobrevivência, afirma-se o triunfo do meio ambiente sobre todos nós. Os principais fatores que caracterizam a cidade são: tempo, cheiro, ritmo e espaço.”

“Nova York”, de Eisner é resultado da fusão de quatro outros trabalhos do autor produzidos entre 1981 e 1992: “Nova York: a grande cidade”; “O Edifício”, “Caderno de tipos urbanos” e “Pessoas invisíveis”. Com seu olhar atento, Eisner constrói um verdadeiro compêndio de personagens. Como ele mesmo diz: “uma espécie de estudo arqueológico dos tipos urbanos”.

Estão presentes no livro os bêbados, as crianças, as prostitutas, os desempregados, os moradores dos cortiços, o músico, o empresário falido, o ladrão, o motorista de táxi... Curioso notar a predileção que Will Eisner tinha pelo bairro pobre do Bronx e por um lugar em especial: a avenida Dropsie. Eisner era um Nova-iorquino legítimo. Nascido e criado no Brooklin é, possivelmente, o artista que melhor soube compreender o espírito da cidade de Nova York: cosmopolita, impessoal, cruel, apressada, surpreendente...

O artista é o observador e narrador. Na maior parte do tempo anônimo. Mas Eisner também se retrata em algumas histórias originalmente presentes em “Caderno de tipos urbanos”. Talvez para acentuar a percepção de que tudo aquilo é real e foi presenciado por ele mesmo durante sua vida, toda ela passada na metrópole.

Assista uma fantástica versão sobre Nova York que une a música de George Gershiwn e a animação da Disney. O filme está em Fantasia 2000. A música é Rhapsody in Blue.

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