sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Uma mulher além do seu tempo

Ativista política, agente secreta da União Soviética stalinista, fotógrafa reconhecida internacionalmente, atriz de Hollywood, volutária da guerra civil espanhola, feminista... A italiana Tina Modotti foi uma mulher impossível de rotular. Tina viveu em uma época conflituosa e de intensa atividade política e cultural, quando arte e ideologia andavam lado a lado e os artistas queriam mudar o mundo com pincéis, canetas e armas. Desconhecida do grande público no Brasil, ela foi amiga de alguns dos mais importantes artistas do século XX, como os pintores Diego Rivera e Frida Kahlo, do escritor Hemingway, do cineasta Sergei Eisenstein, do poeta Maiakovski e do escritor brasileiro, Jorge Amado.

O artista espanhol Angel de la Calle resgatou para o mundo a história de Tina após um minucioso trabalho de 15 anos de pesquisa. O livro (publicado no Brasil pela Conrad) vai lembrar aos que já conhecem um pouco sobre quadrinhos o livro Maus, do artista americano Art Spielgman. O traço de Angel foge ao clássico. É um estilo nervoso e dinâmico que confere velocidade à narrativa. Angel conduz a história entre a biografia e o romance de espionagem. O resultado é excelente. O livro prende o leitor do primeiro ao último quadro. Mérito do estilo do autor, mas principalmente da fantástica vida de Tina.

Italiana, Tina emigrou para os Estados Unidos aos 14 anos junto com a família em busca da tão sonhada prosperidade americana. No começo da década de 1920, ela tornou-se estrela em Hollywood. Amante e aluna do famoso Edward Weston, ela fotografou intensamente a paisagem e o povo do México, país que foi profundamente marcante em sua obra e sua vida.

Militância política


Foi no México que ela se afirmou como fotógrafa e onde iniciou sua militância política através do partido comunista. Na época, o trânsito de comunistas entre o país e a União Soviética era intenso e as intrigas internas dentro do próprio movimento provocavam misteriosos assassinatos entre os divergentes.

Em 1929, Julio Antonio Mella, fundador do partido comunista cubano e amante de Tina, foi assassinado em circusntâncias que nunca ficaram esclarecidas. Tina se viu transformada na principal suspeita. Acusada de espionagem pró-soviética, ela acabou expulsa do México. Depois de uma passagem pela Alemanha, ela chega à União Soviética onde abandona a fotografia para se dedicar integralmente à militância. Trabalhando para o Socorro Vermelho Internacional, Tina atuou como tradutora, escreveu artigos, deu conferências em fábricas...

Em 1935 ela foi enviada para uma missão na Espanha. Seu trabalho era dar apoio ao partido comunista que enfrentava problemas nas Astúrias. Tina se viu então em meio a uma guerra civil sangrenta trabalhando como enfermeira ao lado das brigadas internacionais. Nesta época explode a perseguição soviética contra os trotskistas. Em maio de 1937, em Barcelona, chegou-se ao enfrentamento armado entre anarquistas e membros do POUM e stalinistas de outro. Franco, em Salamanca, ria. Stalin, em Moscou, também.

Por razões não conhecidas, Tina também entra na mira. Quando as brigadas foram forçadas a deixar a Espanha, ela tentou fugir para os Estados Unidos, mas foi delatada pelo partido e acabou tendo de voltar ao México. Os anos de clandestinidade e principalmente o choque causado pelo pacto de não agressão entre Stalin e Hitler e pela perseguição dos stalinistas contra amigos pessoais de Tina a abalaram. Em 1941, Trotski foi assassinado. Ninguém estava mais a salvo. Qualquer pessoa poderia ser considerada uma ameaça aos interesses soviéticos e morta sem qualquer julgamento ou justificativa.

Tina morreu em 5 de janeiro de 1942 dentro de um táxi. As circunstâncias de sua morte levantam suspeitas de que ela tenha sido assassinda pela KGB. A autópsia afirma que ela teria morrido de um ataque cardíaco. Mas Tina nunca havia sofrido de problemas do coração. Por outro lado, o sindicado dos taxistas da cidade do México era controlado pelo partido comunista. Nos levantamentos feitos para escrever o livro, Angel descobriu que não foram raras as mortes de conhecidos anti-stalinistas ou de comunistas opostos à direção do partido a bordo de taxis, sempre em ataques do coração.

O corpo de Tina está enterrado no cemitério da cidade do México, o maior da América Latina, em um lugar discreto. Sobre o túmulo, versos que o poeta Pablo Neruda escreveu para a amiga:"Descansa docemente companheira. Puro é o seu doce nome, pura é sua frágil vida. Como abelha, sombra, fogo, clarão, silêncio, espuma. De aço, retilinia, do polém se construiu sua tenacidade, sua delicada estrutura."

Conheça o trabalho de Tina

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